O projecto de entrevistas que me tinha proposto está quase completo, ele constava de uma troca de impressões com o presidente do CPA, único clube de dimensão de autocaravanistas, com um leitor da Newsletter, Mr. Bogus,
e também com uma autocaravana, personagem central do autocaravanismo.
Hoje cabe a vez à Triganinha, nome e cognome de uma van ou camper, também chamadas por vezes de autovivendas, mais concretamente de uma linhagem de furgons transformados, e erudita, porque escrevem (ou ditam) não apenas memorias, mas blogs contemporâneos de autocaravanismo. E com a qualidade que é conhecida dos leitores do Blog Viajar em Liberdade. Ora bem....aqui vão as perguntas (claro que não se pergunta nem a idade, nem o peso, nem pela manutenção e apetite a uma senhora) e as respostas...
1) Desde quando dita os seus comentários sobre autocaravanismo? E quando se decidiu pela actividade? Qual a fonte de inspiração? E como são as fotografias?
Resposta - Bom, infelizmente eu não sei escrever, mas fiquei tão satisfeita com a minha dona, por me ter tirado, dum espaço com grades, onde estava parada e ninguém me queria, que resolvi pedir-lhe para ela partilhar a minha felicidade. Como fotógrafa, também em nada contribuo, pois isso é um sector da minha dona, também aí sou eu que lhe peço e ela vai registando.
2) Como eram as suas antecessoras? Algumas saudades? e quem pensa que lhe vai suceder e porquê? com que idade?
Resposta – A minha antecessora era bem mais “importante” do que eu, era uma VW Westfalia, mas não tinha o carinho que eu tenho pela minha dona, normalmente recusava-se a pernoitar fora de Campings, dizendo que não tinha sido concebida para isso, estava sempre a levantar o pescoço e a “crescer” para a minha dona e penso que foi esse o desentendimento entre elas. Penso que ninguém mais me irá suceder, pois eu e a minha dona temos uma grande cumplicidade, ela já me confessou que quando não tiver mais hipótese para tratar de mim, pela sua idade, ou quando eu estiver velhinha, me deixará a descansar num “lar”- oi desculpe Camping e passará comigo todos os fins-de-semana.
3) Quais os melhores momentos das suas viagens e onde? e problemas? como os superou? que boas recordações?
Resposta: Talvez a viagem que tenha gostado mais de fazer tenha sido a do último Verão, vi muita família, conheci muitas Acs e Vans como eu, aqui em Portugal sentia-me um pouco sozinha, mas em França há muitas pessoas que nos adoptam. Mas para mim todas as viagens são boas desde que não me enfiem em Campings, e me deixem rolar.
Problemas graves! Hum, que me lembre foi, um só. No ano passado pela Páscoa na Andaluzia mais propriamente em Coin, perto de Málaga. Tentaram-me assaltar. A minha dona deixou-me sozinha e um malandro com uma faca cortou-me 2 sapatos. Como eu estava sozinha, e não podia fazer nada aguentei, e quando a minha dona chegou, não lhe disse nada para não a enervar. Pois pensei que o malandro estivesse por ali e a atacasse. Então passados uns 5 km, dentro da povoação, disse-lhe:
-“ Pára que eu não posso andar mais, vê os meus pés, estão feridos, os sapatos estão rotos.” Estavam mal e fomos logo ao médico bem perto que me tratou dos pés e a minha dona comprou-me uns sapatos novos.
Recordações são muitas, mas a primeira que não consigo esquecer foi mesmo quando a minha dona me tirou do “orfanato”outra vez desculpe é a minha primeira entrevista pública – digo stand.
Foram só 40 Km, mas não dá para esquecer a sensação de liberdade que tive.
4) Com que primos ou família gosta mais de viajar? ou prefere andar sozinha? e por onde mais se tenta? localidades? atracções? estradas?
Resposta – Bom já viajei com outros familiares, também não é mau, vai-se brincando pelo caminho, faz-se corridas, etc, mas eu sou imprevisível e nesse aspecto a minha dona também. A nossa cumplicidade aí bate o record, ás vezes sou eu com o meu amigo Gps que resolvemos trocar as voltas à minha dona, outras vezes é ela, tão imprevisível como eu que nos troca as voltas. Mas eu nunca digo nada, para não a decepcionar, já o bom do GPs, sabe como é, um macho entre duas fêmeas, e porque ninguém me avisou, e porque ninguém me consultou, estão tolas, enganaram-se, voltem para trás e resmunga, resmunga, nós com a nossa cumplicidade rimo-nos as duas para dentro, até que a minha dona, se zanga, porque ele não pára, sabe? E dá-lhe uma palmada e reduz o pequeno à sua insignificância. Preferimos mesmo andar sozinhas para que ninguém dependa de nós. Como sabe eu sou muito citadina a minha dona também é muito urbana, então preferimos essas paragens, mas adoramos o mar, isso é que eu gosto, quando ela me põe de frente a ver o mar. Fazemos auto estrada quando estamos com pressa, mas normalmente gostamos das estradas secundárias, eu porque gosto de saborear a estrada e não levar com um TIR em cima, ela porque gosta de observar a paisagem. Enfim um pouco de tudo, para diversificar, sabe que a monotonia, é a coisa pior para mim e para ela. Ah já me esquecia, gostamos muito de cidades pequeninas…
5) como é a vida a bordo da Triganinha? horarios? refeições? leituras? escritos? internet? locais de pernoita?
Resposta: A vida a bordo, hum nem queira saber, vou tentar ser breve mas olhe que não é fácil. Com a minha dona, nunca há 2 dias iguais. Horários nem vê-los, à noite combina comigo, amanhã arrancamos cedo, está bem. Ora ora o cedo é depois do almoço. Já eu estou a ferver na testa de tanto sol que apanho. À noite, quero descansar e ela nunca tem sono, arranja-me aqui, penteia-me ali, lava-me a cara, faz-me a higiene, limpa-me os olhos, sei lá, não me deixa descansar. As refeições, bom, o pequeno-almoço tomamos as 2, depois ela tem o cuidado de arranjar um sítio bom para mim, eu fico a descansar e ela vai passear. Normalmente não almoça comigo,
Mas o jantar estamos as duas a saborear o dia, ela conta-me o que fez eu digo-lhe para ela apontar senão esquecesse, não Internet não há em viagem, ainda bem, senão eu deixaria de ser a sua maior paixão, já não me falta ter de aturar o amigo Gps. A leitura é mais de Inverno, nos fins de semana e menos em viagens grandes, pois com aquela mania que ela tem de me tratar todos os dias, e da minha higiene…, mais conversarmos sobre o percurso e tal, não dá. Só mesmo nas férias pequeninas. As pernoitas como é do conhecimento de todos eu gosto de estar sempre no ir, daí que prefiro sem dúvida a via pública, as Áreas que fazem para nós, sinto-me muito importante sabe? Dormir naquele espaço feito a pensar em nós, em sítios com outras familiares, sempre vamos trocando impressões acerca dos nossos donos e das nossas viagens. E por fim quando é o banho semanal, não há volta a dar, aí a minha dona diz:
- Triganinha calma é só um dia, temos muito que lavar.
E eu um pouquito triste obedeço, sei que ás vezes ela tem razão, não há outra hipótese, mas ela não abusa.
6) Se alguem quizesse fazer a mesma opção que recomendava? uma prima da Triganinha? de que criação? ou algum parente proximo? com que equipamentos e caracteristicas?
Resposta: Já me está a fazer perguntas complicadas, sabe que eu como mulher que sou, percebo pouco de mecânica, mas irei dar o meu melhor. Para uma pessoa só, casal ou 2 que gostem de passear, sempre a rolar, aconselho uma irmã. As minhas irmãs mais novas. Depois dentro do meu género, quase para o mesmo fim há umas, um pouquito mais descuidadas com a linha, mais largas de cintura e anca, as Vans da Hymmer, Marcampo perfiladas, enfim para dois também com mais peso.
Se não é só para rolar, mas do tipo permanência de uma semana e com filhos então as minhas mães ou pais, Cappuccinos, Integrais. Equipamentos, olhe, eu gosto muito da minha camara de recuo que me ajuda a ver tudo e do meu painel solar, juntamente com a bateria auxiliar. De motor não percebo muito mas para aí 2.3 a 2.8. conforme o tamanho. Não sei se era esta a resposta que pretendia….será?
7) Onde e como prepara a Triganinha as suas viagens? as de fim de semana, as mais longas de ferias? Qual vai ser a proxima?
Resposta: As viagens, são preparadas pela minha dona, claro que ela me pergunta a opinião. Faz pesquisa, consulta sites de turismo, pergunta nos fóruns, consulta sites como o meu de outros amigos, e vai planeando, mas se quer que lhe diga, não percebo porque é que ela tem tanta trabalheira, depois nunca cumpre, que o diga o a meu amigo Gps. O principal cumpre-se mas etapas e itinerários é só mesmo no papel, depois é ao sabor do vento e das marés, é mesmo viajar em liberdade. Fim-de-semana, não há preparação. É daquelas coisas imprevisíveis, pega em mim e lá vamos, nem pergunta se eu quero, outras vezes, passam meses que não saio. Não sei se tem a ver com aquilo que os humanos chamam trabalho. A próxima acho que é a Itália, mas com lhe digo ela está sempre a mudar.
8 )E que acha do autocravanismo em Portugal? esta de saúde e recomenda-se, ou precisava de médico? e porquê?
Resposta: Só me faz perguntas difíceis, essa tem de fazer à minha dona, pois eu só sei o que acho das Autocaravanas. Estão a aparecer muitas, muitas lindas, mas também há muitas velhinhas que são emigrantes é assim que se diz não é? Se calhar precisam de médico pois demonstram ter muita idade.
9) e os autocaravanistas? têm consciencia do que são, quantos são e quantos podem vir a ser? e que regulamentação para o sector é desejavel?
9) e os autocaravanistas? têm consciencia do que são, quantos são e quantos podem vir a ser? e que regulamentação para o sector é desejavel?
Resposta: Aqui também não lhe posso valer, só lhe posso falar pela minha dona. Ela respeita tudo, está a tornar-se fundamentalista … é o traço, é o espelho, não pisa, não fica de fora, não cospe, não suja, está sempre a repreender-me, aqui para nós eu acho que já é da idade. Cumpre as cartilhas todas que apanha, eu sou testemunha. Penso que já há muitos autocaravanistas, pois sempre que vejo uma amiga, ela leva alguém com ela, nunca vai sozinha, agora quantos são desconheço, não lhe posso prometer, mas vou contar todos os nacionais que se cruzam comigo, quem sabe para o ano, já lhe possa dizer quantos vi….
O que eu gostava era de ver leis para mim, mesmo para mim.
10) A Triganinha que conselhos dá a quem queira experimentar ter um modelo como o seu, ou parecido? Que atitude e perfil deve ter? e como se deve relacionar com o meio autocaravanista?
Resposta: Já lhe respondi a parte desta pergunta em cima. Agora para quem se quer iniciar e não tem a certeza, talvez falar no “orfanato”, ai outra vez no stand, experimentar antes da adopção, para ver se os feitios se dão enfim, descobrir uma com a qual se sinta cúmplice. Frequentar sites que nos fazem referencia, fóruns, páginas amigas e colher alguma experiência antes de se decidir.
2 comentários:
Boa entrevista, a triganinha é muita boa como contadora de estórias.
Parabens.
Kunha e Kosta
Hoje a Triganinha e toda a sua família, estão de luto. Os Humanos mais uma vez, não souberam utilizar a sua inteligência, e a pouco e pouco, estão não só a destruir o planeta, como também a destruir um dos maiores bens que algum ser pode desejar - A Liberdade.
Quem se quiser solidarizar à tristeza sentida por todas as Autocaravanas,e assim manifestar o seu pesar pela vergonha dos Homens, poderá enviar um email à Triganinha.
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